01 September 2007

Dilema

Abraça-me! Envolve-me em ti! Sinto o teu toque, o teu calor! Quero-te!

Chega-te para lá! Sofocas-me, matas-me aos poucos! Deixa-me em paz, LIBERTA-ME!

Não vás, fica só mais um pouco! Sinto-me mal sem ti! Quero-te! Estás aí?

Mergulho no teu abraço. Deixo-me levar pelas ondas de prazer. Pecado? Talvez! E o Inferno aqui tão perto. Vale a pena? Beijas-me mais uma vez! Quero-te!

Pára! Isto não está certo! Vai-te embora! O Céu cada vez mais longe... Fecho os olhos, o silêncio... Está frio!

Chega-te para cá! Aquece-me de novo.

Não venhas, não te quero ver nunca mais... E nunca mais parece-me tanto tempo...

Que se passa? Porque fugiste? Já não me queres? Já não gostas de mim? Acabou tudo, assim, sem mais nem menos? Porque não ficas mais um pouco?

Desejo-te como nunca antes desejei ninguém... AMO-TE!

Não, ODEIO-TE! Fazes-me mal....

Não, fazes-me bem...

O coração é tão frágil... Por isso não o entregamos a ninguém... Mas doi não o entregar.... Mas doi quando se entrega.... Mas doi quando se parte.... Mas doi quando se tenta colar todos os pedaços...

E agora?

28 August 2007

Vizinhos I



Moro numa rua como tantas outras... E daí talvez não. Apesar de localizada no meio da cidade, ainda é uma rua onde as pessoas se conhecem, onde o café da Dona Alzira ("Orquídia") ainda é ponto de encontro para desabafos, cusquices e discussões políticas e futobolísticas. Nasci e sempre morei aqui e não me lembro das coisas serem diferentes. E é uma rua onde existem pessoas para todos os gostos e feitios.

Não é de estranhar, portanto, que a chegada de novos vizinhos tenha gerado curiosidade e muita conversa. A Tia Alice (como é conhecida por todos) sempre à janela, a ver mobílias a entrar, a controlar todo o processo de mudanças dos "novos", como já eram tratados por todos cá na rua.

Um casal com um filho (mais ou menos da minha idade acho) é tudo o que se sabia sobre eles. Mas conhecendo a dinâmica e as pessoas cá da rua, sei que depressa se iria saber muito mais.

E não foi preciso esperar muito tempo. Bastou uma ida da nova vizinha (coitada mal sabia onde se estava a meter) ao "Orquídia" para que o interrogátorio (embora bem disfarçado) começasse. E foi fantástico ver como naquele momento em que ela entrou, quase todos os vizinhos (incluíndo a minha mãe) decidiram ir beber café. Depressa fiquei a saber que os novos vizinhos eram Doutora Joana (médica), o seu filho Pedro e o novo companheiro Luís (enfermeiro).

Claro que a minha mãe (boa vizinha como é) me dispoibilizou logo para mostrar ao Pedro a zona e apresentar alguns amigos, uma vez que eles eram das ilhas e não conheciam nada daqui.

"- A ver se vais dar uma volta com o rapaz, coitado. A Doutora Joana disse que isto não está a ser fácil para ele. Foi o divórcio dos pais, que ela disse que não foi nada amigável, e agora o estar num sítio novo, longe de tudo e todos que conhece.

- Mas mãe....

- Não te ponhas com histórias. Se fosse ao contrário também ias gostar que te ajudassem. Inda por cima a Tia Alice diz que os pais se separaram porque a Doutora Joana se enrolou com o enfermeiro...

- E como é que ela sabe?

- Oh filho sei lá. Deve ter percebido pela conversa..."

E é assim que começam os boatos cá na rua... O velho "diz que disse". A minha mãe mete-me em cada uma...

Enfim! Vamos lá ver o que isto vai dar....

25 March 2007

Sem Rumo IV - A primeira despedida

“Sem duvida que a tarde de ontem foi estranha, ou simplesmente diferente. Para não variar a Isa estava atrasada e lá fiquei eu na esplanada d’O Orfeu, a reclamar com os meus botões. E foi aí que tudo mudou. Ele apareceu sei lá eu de onde. Ao início fiquei de pé atrás, com a conversa de um estranho, uma historia mirabolante de uma viagem sei lá eu de onde… Mas depois os olhos, aquele olhar que cativa, que não esconde nada, quase que lhe tocava na alma só pelo olhar sincero e triste… E acabámos a conversar durante algum tempo… Mas não chegou… Claro que não lhe neguei ajuda, não queria nem poderia fazê-lo. Demos um passeio curto pela cidade mas não poderíamos ficar por ali. E então convidei-o para o dia seguinte… e ele aceitou! Despedimo-nos na entrada do hotel e regressei a casa. Mal jantei, mal dormi. Aquele olhar não me saía da mente. Levantei-me cedo e arranjei-me mais depressa que o habitual. Ainda estive no café a fazer tempo, mas não aguentei mais. Fui até à recepção do hotel e perguntei em que quarto estava ele. Subi e decidi fazer-lhe uma surpresa. Ainda estive um bom tempo à porta, sem saber se deveria bater ou não, mas a vontade falou mais alto. Três pancadas chegaram para perceber que alguém vinha abrir a porta… E foi então que ele surgiu, só de toalha e ainda todo molhado…”

Acordar sem o barulho ensurdecedor do despertador era algo que não me acontecia há muito tempo. Levantei-me e fui até à janela. Dei por mim a sorrir logo pela manhã, algo extremamente invulgar. Dirigi-me para o banho, com a calma característica de quem não tem nada para fazer, e aí fiquei, perdido no tempo, até ser chamado de volta para a realidade com três pancadas tímidas na porta do quarto. Enrolei uma toalha à volta da cintura e abri a porta. Era ele. Tinha cumprido o prometido e vinha-me buscar para o nosso passeio pela cidade.

“- Bom dia! Se calhar vim cedo demais…
- Olá bom dia! Não estava à espera de e ver tão cedo…
- Se quiseres espero por ti lá em baixo…
- Não, entra! Eu adormeci e ainda estava a tomar banho. Espera só um pouco que é só o tempo de me arranjar! Senta-te aí!”

Ele entrou e sentou-se na cama enquanto eu fechava a porta. Estava visivelmente envergonhado por toda esta situação, mas eu confesso que achei alguma piada. Dirigi-me à minha mochila que estava no chão e baixei-me para retirar a roupa.

“- Então dormiste bem?
- Como não dormia à anos…
- Sério? A cama é assim tão confortável?
- Bem não se compara à minha cama… Mas anda assim não me posso queixar…”

E foi quando me levantei com a roupa na mão que tudo mudou. A toalha cai e fiquei completamente nu e vulnerável em frente daquele rapaz. Foi a minha vez de fikar envergonhado…

“- Desculpa…”

Tentei apanhar a toalha do chão, mas quando olhei já o pé dele estava em cima dela.

“- Deixa estar… Eu até gosto do que vejo…”

Seria aquilo um piropo? Um elogio? Ele estava a atirar-se a mim? Ou apenas a ser simpático e brincar um pouco com a situação? A minha mente começou a trabalhar mais depressa do que eu conseguia acompanhar… O que é que se estava a passar? E quando dei por mim já os meus lábios tinham encontrado os dele! Senti as suas mãos a percorrer cada centímetro do meu corpo. Foi demasiado estranho! Eu queria parar… Eu não queria parar… Os primeiros beijos foram tímidos, como quem não sabe o que está a fazer…. Mas depois as nossas línguas encontraram-se. O momento estava a tomar conta de nós. Larguei as roupas e puxei-o para a cama. Ele veio e explorou cada recanto do meu corpo com as mãos e a língua. Tirei-lhe a roupa com o cuidado e carinho que o momento podia e fizemos amor, trocámos carinhos, foi um daqueles momentos em que dois se tornam um…

Não sei o que pensar do que tinha acabado de acontecer. Há hora do jantar, ele despediu-se de mim e eu dele com a ternura e a saudade de quem sabe que não nos voltaríamos a ver. Mal ele se foi embora arrumei as minhas coisas e parti. No comboio em direcção ao porto chorei, não só de saudade e tristeza, mas também com o coração e a mente repletos de novos sentimentos. E agora? Devia ter-lhe dito algo? Devia ter guardado algum contacto?

Perdoa-me…
Foto gentilmente cedida por Ogi (obrigado)

24 February 2007

Querido Diário II

Sexta-feira, 4 de Dezembro de 1998

Querido Diário,

Hoje vi-me aflita para convencer a mamã a deixar-me ir à discoteca "Kappella". Tinha combinado com o Jó-Jó lá à porta porque a mamã não podia vê-lo, nem sequer desconfiar que ele existia.

Claro que assim que perguntei se podia sair veio o interrogatório do custume: "Com quem vais?"; "Onde vais?"; "A que horas vens?". E como já é habitual nem sequer me deu hipotese de responder: "Quero-te em casa ás onze horas. Se queres dinheiro pede ao teu pai!". É obvio que o papá não me ia dar nem um tostão e ela sabia.

Quando já estava com um pé fora de casa mandou-me parar e fez de novo o nterrogatório. A sorte é que já tinha combinado com a Teresa e a Ritinha de dizermos que iamos ao cinema as três, porque elas iam sair com os namorados. Pois não me deixou sair de casa sem antes ligar para as mães delas...

Só que a noite não acabou aqui... Depois deste trabalhão todo para sair de casa, fiquei duas horas à porta da "Kappella" à espera daquele miserável, aquele crápula, insensivel, estupido, camelo, otário e podia continuar a noite toda a insultá-lo, mas seria perder o meu tempo.

Nem sequer foi capaz de me avisar aquele urso... Segunda quando o vir na escola acho que...

Depois conto-te

A.S.

24 January 2007

Sem Rumo III - A primeira Viagem

Ao entrar no comboio não pude deixar de sentir que talvez estivesse a cometer o maior erro da minha vida. Tive vontade de desistir, voltar para casa e assumir a rotina de sempre. Mas já não era possivel. Eu não podia voltar, e acima de tudo, eu não queria voltar. Sentei-me e vi Lisboa ficar para trás através da janela. Despedi-me assim de tudo e de todos que tinham feito parte da minha vida. Permaneci imovel durante toda a viagem, talvez paralisado pelo receio das consequências do que acabava de fazer.

Cheguei a Espinho e depois de um pequeno passeio percebi que não era ali o meu destino, não era por ali que queria ficar. Apanhei então um transporte que chamam "Vouguinha" e acabei na cidade de Santa Maria da Feira. Porquê? Não sei. Mas senti que era ali que tinha que ficar.

Depois de andar um pouco a fome apertou. Afinal ainda não tinha comido nada o dia todo. O sol já se ia despedindo e a noite ameaçava chegar a qualquer momento. Sentei-me numa esplanada de um café chamado "Orfeu" e não pude deixar de me rir quando pedi uma sandes mista e um café. Afinal nem todos os hábitos se podem perder...

Foi só nessa altura que me apercebi que ainda não tinha pensado onde dormir. Não podia ficar na rua, mas também não sabia onde me dirigir. Tinha então duas hipoteses: ou ia passear pela cidade e tentar encontrar algum sitio, ou perdia a vergonha na cara e perguntava a alguém. E foi então que o vi. Ele acabava de chegar e estava a sentar-se numa mesa perto da minha. Decidi arriscar e fui meter conversa com ele. Comecei por me apresentar e explicar a situação em que me encontrava. Ele apresentou-se visivelmente desconfiado. Também não era para menos, esta não era uma situação tipica.

Acabamos por falar durante algum tempo. Ele estava à espera de uma amiga, mas como percebeu a minha situação, acabou por lhe mandar uma mensagem a desmarcar e decidiu mostrar-me a sua cidade. Um verdadeiro "filho da terra" com orgulho nas suas raizes. Como já era tarde indicou-me o "Hotel Nova Cruz" e ficou prometido um passeio mais detalhado pela cidade no dia seguinte.

Fui deitar-me com a sensação de que ainda existe gente boa neste mundo. E dormi com uma paz e alegria que já não sentia há muito tempo...

Foto gentilmente cedida por Ogi (obrigado)

11 January 2007

Querido Diario I


Encontrei um diário antigo. Talvez o mais correcto a fazer seria deixar as suas memórias enterradas, mas a verdade é que não resisti e violei os segredos mais profundos de outra pessoa... A curiosidade falou mais alto. O pior de tudo é que não resisti em partilhar esses segredos com todos os que os queiram ler... Desde já as minhas desculpas à dona destas páginas. Só espero que um dia me possa perdoar...

Quarta-feira, 2 de Dezembro de 1998

Querido Diário,

Antes de mais desculpa. Sei que já não escrevo à muito tempo, mas a verdade é que com os testes e isso tem sido difícil. Mas hoje era impossível não te contar o que me aconteceu: dois dos maiores sustos da minha vida. Logo de manhã, depois de acordar e ir até à casa de banho, ia desmaiando quando passei pelo espelho. Tinha uma borbulha enorme mesmo no meio da testa. Tive um trabalhão para disfarçar aquela coisa. Quase uma hora em frente ao espelho a aplicar cremes e loções da mamã, até aquilo desaparecer. Ou melhor até ninguém a conseguir ver porque ela continuava lá. Mas isto não foi nada comparado com o que aconteceu de tarde.

Como eu não podia sair de casa porque a mamã podia telefonar, o Jó-Jó veio ter comigo em vez de irmos para o café... Trouxe-me uma rosa e tudo! Cada vez me sinto mais apaixonada por aquele rapaz (vê lá tu que nem consigo estar perto dele sem corar).

O pior foi quando a mamã chegou do trabalho. Não demos pelo tempo passar. A sorte foi que consegui escondê-lo na dispensa até a mamã ir tomar banho, altura que ele aproveitou para sair. Sinto-me tão feliz com o Jó-Jó que era capaz de tudo para salvar o nosso amor!

Até breve...

A. S.


10 January 2007

Sem Rumo II - O dia Seguinte


Merda de vida. Fartei-me. Não posso mais continuar assim... Esta ia ser uma manhã como tantas outras, um dia igual a todos os dias da minha vida. Mas não, desta vez não. Levanto-me com uma energia que eu próprio não reconheço. Tomo o meu banho e em vez de me preparar para o trabalho começo a fazer a mochila.

Saio de casa, sem destino e com a mochila às costas. Passo pelo café do Sr. Jorge e sinto-me tentado a entrar. São anos de cafézinhos e sandes mistas todas as manhãs. Paro à porta. Por momentos penso: "O que estou eu a fazer?"

O Sr. Jorge acena-me e desperta-me de novo para a dura realidade. Retribuo o gesto, mas não entro, sigo viagem.

Vagueio pelas ruas da cidade. As pessoas passam por mim, indiferentes às minhas duvidas, aos meus receios, presas no seu mundo, nas suas alegrias, nas suas dores. Quando dou por mim estou na Gare do Oriente. Olho à minha volta. Uma mãe despede-se aflita do seu filho e do grupo de amigos deste, fazendo as recomenações habituais das mães nestas ocasiões. Mais à frente, um reencontro. Ela sorri, ele larga o seu saco de viagem, corre para ela e abraça-a... Um abraço tão terno, tão profudo, tão apaixonado que é impossivel ficar-lhe indiferente. E sinto-me feliz pela primeira vez em muito tempo.

Olho para o placar com as linhas. O nome Espinho salta-me à vista. E penso: "Porque não?". Compro o bilhete e quando me dirigia para a plataforma oiço o telemovel. Dez chamadas não atendidas do meu chefe. Novamente a duvida toma conta de mim. É melhor esquecer tudo isto e voltar para casa. E é então que aquele abraço me invade de novo o espirito. Tiro o cartão do telemovel, parto-o em dois e deito os seus restos mortais no lixo e sigo o meu caminho.

Inicio assim a minha viagem...